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Novos escritores têm alguma chance? O que as editoras querem? Como conseguir que as pessoas leia-o?

Ainda de 2019


ALERTA DE TEXTÃO


Texto original: Laura Bacelar

Comentários extras no texto: Meus


Muitos escritores acham difícil dar os passos seguintes ao término da obra. Têm uma página no face, mas poucas curtidas, quase nenhum compartilhamento. Colocam no Wattpad e não angariam mais que meia dúzia de leitores. Chamam os amigos para ler mas poucos respondem, nenhum comenta.

Mandam seu original sem preparo para editoras e recebem desde respostas negativas à de prestadores de serviço querendo que os autores paguem pela impressão.

O que fazer para vencer a barreira de ser um autor desconhecido? Isso é possível?

Sim, é. Há um caminho possível, mas é provável que você precise mudar um pouco sua forma de pensar.

Vou explicar em várias partes, tenha um pouco de paciência. Apesar de parecerem problemas distintos – editoras, público leitor, ser conhecido –, na verdade são uma questão só, com vários aspectos. Afinal, o que as editoras querem?


O que as editoras querem?

As editoras querem, e na maior parte das vezes consideram, sim, publicar autores nacionais, porém com a condição de que tenham uma postura profissional e que a obra esteja pronta.

Editores não querem perder tempo ensinando a autores como se profissionalizar, nem querem investir um monte de trabalho para transformar uma obra com muitos defeitos numa obra publicável. Pelo menos não se o autor não for já muito famoso.

Mas é perfeitamente possível que você aprenda a fazer as duas coisas, assumir uma postura que impressione bem editoras de verdade, e apresentar uma obra acabada, que possa ser publicada.


Postura profissional - Auto-suficiência

Autores precisam entender que ninguém no mundo editorial se vê como responsável por colocar autores inexperientes, sem noção de como as coisas funcionam, no colo. Quem se mete a escrever para ser lido e publicado precisa aprender por conta própria como as coisas funcionam. Não, não há um agente que vai cuidar de tudo. Não, não há um editor que vai cuidar de tudo. Não, não basta escrever bem, ter criatividade e boas ideias.

Editores sentem um horror instantâneo por autores que chegam (por cartas ou e-mails ou mensagens) chorosos, arrogantes, insistentes, exigindo respostas. Pobres vítimas de um sistema que não os favorece ou raivosos por não receberem atenção.

Se você é autor/a, considere que faz parte de sua carreira aprender como o mercado funciona. Vá atrás da informação. Entenda os tipos de editoras existentes, os gêneros literários, o que tem feito sucesso. Aprenda por você, para tomar suas decisões. Seja responsável, aja como maior de idade. Não queira que alguém venha fazer tudo por você.


Compreensão do risco

Livros são produtos culturais, assim como músicas, filmes, peças de teatro, shows. Produtos culturais fazem sucesso quando um grupo de pessoas – chamado de público – gosta deles. E apesar do que imaginam montes de escritores, não é possível fazer ninguém gostar de uma obra.

O marketing pode aumentar as vendas de um livro, mas não se o livro já não contiver elementos que agradem aos potenciais leitores. Não se força a venda de livros, não se fabricam best-sellers do nada. Se as pessoas não gostam, não vai.

Não quero me estender nesse assunto, que é tema de outra postagem, mas pense na J.K.Rowling quando lançou Morte súbita: as vendas iniciais foram enormes por conta de ela ser a autora de Harry Potter, mas não conseguiu emplacar o livro como best-seller. No geral, os leitores não gostaram.

Vou repetir: a autora mais famosa do mundo não conseguiu transformar o lançamento mais divulgado do mundo num best-seller.

E vou confessar a você um segredo que todo editor sabe, tendo aprendido na prática: não dá para prever o que vai cair no gosto das pessoas. Alguns livros a gente tem certeza de que vão fazer sucesso por conta do tema, do autor, do momento, e – nada – eles ficam nas prateleiras. Alguns livros a gente acha que não vão acontecer e – buuuuum – eles estouram.

Todo autor, toda autora tem, portanto, que entrar no jogo com espírito de aventura. Não há garantias, o público é um animal imprevisível. E editores podem querer assumir o risco de publicar sua obra – ou não.

Você não tem que ficar ressentido ou se achar fracassado nem nada disso. Escrever é risco, publicar é risco. Pode dar certo, pode não dar.


Conhecimento

Editores querem autores que saibam responder a quatro perguntas:

Em que gênero sua obra se encaixa? (mesmo que seja no gênero literatura adulta, culta, que se imagina acima dos gêneros)

Você tem que saber dizer onde, no enorme panorama de publicações, a sua obra se encaixa, com quais ela se parece e com que outros autores ela dialoga. Se ela não se encaixa em lugar nenhum, não bom.

Com quais obras a sua compete?

Editores partem do princípio de que, se você não tem ideia das outras obras existentes no mercado que dizem algo semelhante à sua, você não é leitor/a. Se não leu o que existe, a chance de ter criado algo relevante, original, é próxima de nula.

O que a sua obra tem de diferente?

De novo, sem o conhecimento do que já existe, você não vai criar algo diferente. Se não houver diferença, tampouco haverá o que justifique o risco. Os leitores vão ficar com os autores que já conhecem.

Para que público sua obra se dirige?

Se você não sabe dizer se sua obra é para crianças, pré-adolescentes ou adolescentes, por exemplo, se não sabe precisar quem é o leitor em quem você pensou quando escreveu sua história ou organizou suas explicações, a chance de ter acertado é baixa. Editores consideram que muito provavelmente sua obra é desfocada.


Note que a postura de auto-suficiência pode ser cultivada, a compreensão de que publicar é um risco não custa dinheiro, e o conhecimento a respeito de sua obra (e do mercado) pode perfeitamente ser obtido com um pouco de leitura e determinação.

Adquirir uma postura de autor/a profissional não é tão difícil assim…


Agora vamos à obra em si.

Obra pronta

O que editores desejam é uma obra que tenha boas respostas para as quatro perguntas que todo autor deve ser capaz de responder.


Gênero?

Algum que seja praticado. A obra precisa ser reconhecível pelos potenciais leitores.

Se for literatura culta, que tenha qualidade e inteligência suficientes para atrair os leitores que apreciam a língua bem trabalhada. Se for policial, que tenha as boas características das obras policiais. Etc etc. A obra precisa pertencer a alguma categoria que já exista, que tenha leitores.

Não invente gêneros, não crie uma língua toda sua, não queira ter uma obra esquisita e fora de todo tipo de padrão publicada.


Concorrência?

A sua obra precisa ter qualidades que a façam sobressair-se naquela categoria, no gênero ao qual pertence. Se é romântica, precisa ter um mocinho muito interessante, uma mocinha que provoque empatia nas leitoras de hoje, e muita tensão sexual. Se é terror, muitos personagens bizarros, sangue, suspense.

A sua obra precisa oferecer algo que leitores daquele gênero não só reconheçam como tenham prazer em ler.

Um mocinho chato, uma obra romântica sem tensão tem pouca chance de agradar leitores, portanto de ser considerada por editores.


Diferencial?

Editores não têm como dizer a priori que diferencial desejam, mas sabem quando encontram algum. Aí julgam se este diferencial lhes parece relevante para o público-alvo. Caso sim, arriscam a publicar a obra.


Simples assim.


E o que é um diferencial?

Algo diferente do que já foi usado naquele gênero. Um pouco diferente, mas que seja relevante para o público.

Por exemplo, obras de fantasia abusam de dragões há muito tempo, dragões são um grande clichê. No entanto, a maior parte dos livros infantis não lhes dava personalidade, e os bichos eram ou muito bobos (livros para crianças pequenas) ou muito perigosos (obras para jovens). A tendência geral ainda continua esta, aliás, vide os dragões de George R.R. Martin.

Em 2003 uma autora inglesa escreveu Como Treinar o Seu Dragão, um livro no qual os dragões são super mal-humorados e preguiçosos, cheios de manhas, e são usados de maneiras inusitadas. Mais, encheu a obra de muito humor, apropriado para crianças de nove e dez anos. O jeito dos dragões e o humor foram diferenciais, deram destaque a esta obra em meio a um mar de obras para crianças.

O personagem fraco e perseguido por colegas agressivos, mas que se dá bem depois de muitas dificuldades, estava dentro do esperado, mas foi a boa qualidade necessária para o gênero, no caso literatura para crianças. A linguagem e imagens adequadas para a idade alvo foram a boa resposta à pergunta que vem a seguir.

Resultado: a autora foi publicada, fez sucesso, escreveu mais onze livros nessa série, fora uma série de contos. E as histórias viraram filmes e desenhos animados.


Público?

Editores querem encontrar uma obra que esteja muito claramente dirigida a um público específico, um público que exista e seja grande o suficiente para possivelmente comprar milhares de livros.

A Cressilda do exemplo acima não escreveu nem pensou sua obra para crianças e adolescentes, ela escreveu para meninos (não meninas) de dez anos. As piadas são para esta idade e sexo. Isso não impede que o livro seja lido por pais a crianças mais jovens, que riem também, nem que adultos gostem da obra, mas ela tem um alvo claro.

Crianças de dez anos são muito diferentes de crianças de sete anos. Meninas são diferentes de meninos. Adolescentes de quinze anos estão numa etapa completamente diversa de quando fazem dezoito anos. Homens de quarenta têm alguns problemas, de cinquenta outros, de sessenta outros ainda.

Por favor, mire. Foque. Saiba para quem você escreve. Se outras pessoas quiserem ler também, ótimo, o mundo é livre. Mas faça sua obra muito interessante e sedutora para um determinado grupo de pessoas, definindo idade, sexo, nível de conhecimento e outra característica marcante, se houver.


O que o público quer?

Por incrível que pareça, o público quer a mesma coisa que os editores. Aliás, é por isso que os editores fazem questão de observar estes aspectos. Editores têm a função de se colocar no lugar de leitores e aí filtrar o que interessa a estes últimos.

Assim, se você não está conseguindo fazer com que haja leitores para sua obra ou para as suas comunicações em mídias sociais e plataformas de publicação, experimente se perguntar:

Qual é a sua postura como escritor/a? Será que você não é agressivo? Choroso? Inoportuno?

Será que você não quer que as pessoas leiam para afagar seu ego e não por que a história ou o assunto de que você trata as interesse?

Você faz postagens adequadas ao meio que utiliza? Nem muito longas, nem muito curtas? Alinhadas com o público que utiliza aquele meio (por exemplo, jovens no Wattpad)? Você se deu ao trabalho de entender quem lê o que e onde?

Pergunto isso porque eu mesma recebo montes de pedidos para ler histórias que parecem ruminações amargas, ou cópias do que já existe, ou tão estranhas que nem consigo entender do que se tratam.

Você consegue situar sua obra no cenário editorial? Sabe quem são seus concorrentes? Sabe o que você precisa fazer para ter um bom livro naquele gênero?

Você sabe dizer qual o diferencial da sua obra?

Você sabe dizer por que o diferencial da sua obra é relevante para seu público-alvo?

Você sabe, por gentileza, dizer com precisão quem é o seu público-alvo?


Duas sugestões

Se você é como a maioria dos autores que conheço, tem bastante dificuldade em responder as perguntas acima. Tudo bem, é comum isso.


Mas que tal mudar?

Leia

Primeiro, disponha-se a aprender sobre o mercado, os gêneros, as expectativas dos leitores. Leia as obras importantes do gênero no qual você pretende publicar. Leia bastante, até entender onde sua obra se encaixa e o que tem de bom e o que tem de diferente. Leia os autores brasileiros, os internacionais, os muito criticados, os que fazem sucesso.


Situe-se. O conhecimento sobre livros faz parte da carreira de escritores bem-sucedidos.


Observe

Depois, disponha-se a entender melhor o público. As pessoas. Seus eventuais leitores.


Se você escreve e não tem retorno, ou pouco, provavelmente falta relevância ao que você diz. É muito capaz que você tenha na mente uma ideia sobre as pessoas, sobre o que as move e incomoda, que não é real. Existe grande possibilidade de você abordar problemas de forma abstrata ou antiquada ou fora de foco.


Sugiro então que entre em contato com pessoas, de preferência quando falam de seus problemas. Por exemplo num grupo como alcoólicos anônimos ou neuróticos ou obesos. Ou mulheres que casam com abusadores.


Que participe de grupos de discussão sobre família ou trabalho ou sexo onde puder. Que seja voluntário no CVV. Que seja voluntário em alguma ong que lide com pessoas.


E que preste atenção ao que elas dizem. Olhe para elas. Ouça as palavras que usam, aquilo de que reclamam.


Aproveite a internet para fazer experiências. Crie uma página de face dirigida ao grupo que estuda ou participe de fóruns e converse. Observe se o que você diz causa reação, se há respostas, comentários.


Assim como o contato com muitos livros de muitos autores vai dar a você uma noção quase intuitiva do que cada gênero precisa ter, o que os leitores querem, quais os clichês mais usados e quais os abusados, o contato com pessoas diferentes de você, em situações desconfortáveis ou duras ou difíceis, vai dar um conhecimento também intuitivo do que é importante.


Se você for um observador atento, vai inclusive perceber com muita clareza as diferenças de interesses em grandes grupos humanos. Não vai mais sentir perplexidade sobre o que talvez mova mulheres de trinta em oposição a mulheres de cinquenta anos de idade. Ou no que negras são diferentes de brancas. Ou o que mães que trabalham consideram essencial.


Minha fortíssima impressão como editora é a de que autores que não conseguem atrair leitores estão imersos em si mesmos. Não observam em volta o suficiente para detectar e abordar os temas que de fato fazem diferença para estes potenciais leitores.


Mas veja que esta é uma atitude bastante possível de ser modificada.


A junção das duas atividades, a compreensão do cenário dos livros e a observação dos anseios das pessoas, tem boa chance de dar a você os meios para criar o diferencial relevante. A experiência pelas mídias sociais ou plataformas de publicação fornecem a oportunidade de testar suas percepções, verificar se captou o que é relevante e o que não é.


Você vai saber o que sua obra terá de diferente, e vai saber que essa diferença vai de encontro ao que um grupo de pessoas quer, expressa, se preocupa, se aflige.


Parece bom?


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